domingo, outubro 30, 2005

«E foi assim que descobri que todas as coisas continuam para sempre, como um rio que corre ininterruptamente para o mar, por mais que façam para o deter.
Sabes, quem não acredita em Deus, acredita nestas coisas, que tem como evidentes. Acredita na eternidade das pedras e não na dos sentimentos; acredita na integridade da água, do vento, das estrelas. Eu acredito na continuidade das coisas que amamos! Acredito que, para sempre, ouviremos o som da água no rio onde tantas vezes mergulhamos a cara, para sempre passaremos pela sombra da árvore onde tantas vezes paramos, para sempredeslizaremos através do silêncio das noites quietas em que tantas vezes olhamos o céu e interrogamos o seu sentido. Nisto eu acredito: na veemencia destas coisas sem principio nem fim, na verdade dos sentimentos nunca traidos.
(...)
E de novo, acredito que nada do que é importante se perde verdadeiramente. Apenas nos iludimos, julgando ser donos das coisas, dos instantes e dos outros.
Comigo caminham todos os mortos que amei, todos os amigos que se afastaram, todos os dias felizes que nunca se apagaram.
Não perdi nada, apenas a ilusão de que tudo podia ser meu para sempre.»

(Miguel Esteves Cardoso)